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Carla Mendes, para o Procel Info
Minas Gerais - Há mais de 30 anos no mercado da energia, o engenheiro de formação, Sérgio Grassi, hoje é empresário e também diretor comercial da empresa mineira Viridis. Mesmo tendo se aposentado em 2014, ele continua a se dedicar a buscar soluções mais eficientes para as empresas se modernizarem e gerirem melhor seu uso de energia, tanto à frente de sua empresa de consultoria quanto trabalhando para várias empresas na preparação de trabalhos de adequação não necessariamente visando a certificação ISO 50.001, de cuja criação participou ativamente. O objetivo é preparar empresas para seguirem um sistema de gestão que funcione e traga benefícios tanto no aspecto econômico quanto de sustentabilidade.
Em entrevista ao Portal Procel Info, Grassi falou sobre sua carreira e analisou o cenário da adoção de práticas de eficiência energética nas indústrias do pais. Ele também comentou sobre o aumento do interesse no país sobre a norma ISO 50.001 - Gestão de Energia.
Confira abaixo os principais trechos da entrevista.
Procel Info: Poderia fazer um breve resumo de sua trajetória profissional no que tange Eficiência Energética?Sérgio Grassi: Minha formação é em Engenharia Elétrica e também fiz algumas especializações na área de Automação Industrial e Gestão de Negócios também. E sempre trabalhei minha vida toda muito voltado para a área siderúrgica, para grandes consumidores de energia. E sempre envolvido com a área de distribuição de energia, manutenção de energia, contratos de energia e, claro, eficiência energética. O que a gente vê nesta última década, principalmente depois do lançamento da ISO 50.001, que foi em 2011, o mercado e os grandes consumidores passaram a dar uma importância maior ao assunto. Quando se fala em economia, o nosso país não é um núcleo de primeira linha. Aqui a gente foi criado com aquela história de que no Brasil tudo é abundante. Energia, água...
Procel Info: Não existia a preocupação com a limitação dos recursos, não é?Sérgio Grassi: É. Alimentação passa por isso também. E é o oposto do que a gente vê com os países que passaram por guerras. Você vê a Europa. A cultura da economia, do uso racional é muito forte. Tanto é que logo que a ISO 50.001 foi lançada, a Alemanha disparou em número de certificações. E até hoje é o país do mundo onde temos mais certificações da ISO 50.001. E aqui no Brasil vemos poucas iniciativas ainda com relação a certificações e programas fortes. Agora, eu diria que a gente vê essa procura mais acentuada.
Procel Info: E você acha que essa procura mais acentuada no momento, no Brasil, é mais pelo aspecto econômico? A ISO é uma consequência de um conjunto de ações que a empresa toma para se modernizar internamente e ser mais eficiente energeticamente. Pela cultura predominante no país você acha que as empresas buscam o processo de certificação mais pela economia de custos ou está havendo uma mudança de cultura neste sentido?Sérgio Grassi: Não tenho dúvidas de que o maior vetor, o que motiva realmente as empresas a investirem em eficiência, é o lado econômico, a gestão de custos. Isso é o que sustenta realmente. Agora, atrás disso, tem um lado ambiental e também um lado social. Quando a empresa investe na redução, por exemplo, do uso de energia elétrica, ela está disponibilizando aquele bem para a sociedade, sem investimentos. Então, realmente é uma ação sustentável, mas o que motiva as empresas é a redução de custos, manutenção e até diria sobrevivência, no caso de grandes consumidores de energia. A gente tem segmentos da indústria em que 60%, 70% dos custos é de energia elétrica. Por exemplo, ferro-ligas, empresas de saneamento também. O grande custo de uma empresa de saneamento é energia elétrica, principalmente para bombeamento. Empresas de gases do ar também têm essa faixa de 60% a 70% do custo em energia elétrica. Se essas empresas não tiverem um programa forte de uso adequado da energia, elas estarão fora do mercado. Isso é o grande motivador da implantação.
Procel Info: Neste caso, esses players do mercado, cuja gestão do consumo de energia é um dos principais fatores de sobrevivência para a empresa, condizem com o tipo de empresa que aqui no Brasil tem buscado a certificação ISO 50.001? Ou não necessariamente? Sérgio Grassi: Não necessariamente.
"Quando a empresa investe na redução do uso de energia elétrica, ela está disponibilizando aquele bem para a sociedade. Então, isso é uma ação sustentável, mas o que motiva as empresas na prática é a redução de custos"
Procel Info:Existe algum ramo ou tipo de empresa que tem alcançado mais a certificação? Sérgio Grassi: Eu não senti isso no mercado não. Eu vejo que hoje é muito diversificado, porque essas empresas que têm um comprometimento muito grande do custo da energia elétrica, principalmente no seu negócio, elas já têm uma cultura voltada para a eficiência, independente da implantação da ISO. Então, são empresas que já têm no seu DNA essa cultura implantada de basicamente sobrevivência mesmo. Ou têm um controle muito apurado deste bem ou dessa linha de custo dentro da empresa, ou ela está fora. Não consegue se manter no mercado. Eu não vejo essa relação da ISO com o grande consumidor. Eu vejo que a ISO veio muito para difundir, de uma maneira geral em todos os segmentos, e praticamente delimitar grandes padrões ou linhas de gestão para qualquer um. Vamos dizer que quase homogeneizou essa utilização ou despertou o mercado de uma maneira geral para o assunto. Essas empresas específicas que sempre tiveram a energia como uma grande linha de custo, já estavam bem atentas ao assunto, pela própria sobrevivência.
Procel Info: Houve algum outro marco temporal, além da ISO 50.001 em 2011, que tenha levado as empresas a essa mudança de comportamento e maior preocupação com a questão da eficiência energética? Antes da ISO, alguma iniciativa motivou até mesmo a equipe para o desenvolvimento da certificação? Sérgio Grassi: Eu diria que no Brasil, o que motivou realmente o país a acordar para o assunto foi a crise energética de 2001. A partir dali o país já começou a acordar e este assunto começou a se tornar importante. Agora, no mundo todo, acho que a grande pegada veio mesmo no lado ambiental com o protocolo de Kioto e todos os movimentos mundiais em prol do meio ambiente. Mas, no Brasil, eu diria que a crise de 2001, com o racionamento, foi realmente um marco. E dez anos depois veio a ferramenta, que é a ISO 50.001, e este ano temos a primeira revisão da norma de 2011. Eu diria que são esses dois marcos para nós: a crise de 2001 e o lançamento da ISO. No mundo, o protocolo de Kioto, pois foi quando o mundo começou a pensar diferente.
Procel Info: Você citou a Alemanha como o país que tem hoje mais empresas certificadas com a ISO. Em que posição o Brasil está neste momento? Sérgio Grassi: Eu não tenho este número atual, mas eu diria que certamente não é um dos primeiros. Na Alemanha tem um fato interessante, que foi um dos motivadores para essa explosão de certificações. Lá tem um programa de incentivo fiscal [redução de impostos] para empresas que têm a ISO 50.001. Isso deu um impulso muito grande às certificações, voltadas também para o lado financeiro.
Procel Info: No Brasil, hoje vemos até algumas linhas de financiamento de bancos para incentivar algumas empresas a se modernizarem em termos de eficiência energética. Pegando o exemplo da Alemanha, então não é responsabilidade só das empresas fazerem com que se disseminem essa prática mais sustentável? Na sua opinião, se o governo modificasse algo em sua política fiscal nesse sentido, ajudaria a promover uma maior adesão das empresas a esses projetos de eficiência? Sérgio Grassi: Eu vejo que isso ajudaria, mas não vejo isso como a grande saída. Quando se pensa em implantar um programa de eficiência energética na empresa, pensa-se em quantos milhões em investimentos que se vão precisar. Na maioria das vezes este é o primeiro sentimento do empresário. E na verdade, não é nada disso. As grandes ações e os grandes resultados vêm de pequenas ações, de mudança de rotina e de procedimentos que já são implantados, às vezes sem nenhum investimento. E isso são as frutas maduras, que a gente fala, e às vezes as empresas não dão importância para isso. Então, a conscientização e a formação de bons profissionais na área são o que eu vejo que seriam o grande caminho para a gente conseguir grandes resultados. Claro, incentivos do governo são importantes e podem ajudar em algumas situações. Mas, se eu tivesse que fazer um grande programa, o primeiro passo seria começar com a mudanças de cultura. As pessoas, os funcionários que são responsáveis pelas operações, muitas vezes são mal formados, mal orientados com relação ao uso correto da energia. Então, este é que eu vejo como um grande caminho para darmos um grande passo: mudança de cultura. Normalmente, nas empresas a gente vê apontarem para o operador, dizendo que ele não sabe operar ou opera mal. Aí tem aquela brincadeira, que de quando se aponta o dedo indicador para ele, tem outros três apontando para você. Porque você não deu condições, admitiu mal a pessoa, ela não tem o perfil para aquela função, não tem a formação para fazer aquela atividade, não tem procedimentos adequados para executá-la.
"Os grandes resultados da eficiência energética vêm de pequenas ações, de mudança de rotina e de procedimentos que já são implantados, às vezes sem nenhum investimento. E isso são as frutas maduras que a gente fala, e às vezes as empresas não dão importância para isso"
Procel Info: E essa é uma função gerencial, certo? De mudança de cultura?
Sérgio Grassi: Exatamente. Se a gente mudasse a cultura com uma lei, com um pequeno contato com as pessoas, seria muito fácil. Mas não é assim. Temos que ter fundamentos, é igual a criação de filhos. Temos que falar, aí no outro dia faz errado e falamos de novo, e de novo. Dá-se exemplos de como deve ser feito e aí vai mudando. É isso.
Procel Info: Desperdiça-se até know-how, não é? Muitas tecnologias mais limpas já existem, mas o país ainda é muito incipiente.
Sérgio Grassi: Até mesmo nas escolas não vemos alguma matéria voltada para isso, para a questão da eficiência no uso da energia, e temos que começar por aí a mudança de cultura. Eu só vejo três coisas para resolvermos o problema de nosso país. A primeira é educação, a segunda é educação e a terceira também é educação. Se a gente tiver essas três, vamos resolver isso tudo. Mas temos que fazer a nossa parte. E a minha parte eu luto para fazer todos os dias, a todo momento. Eu acho que é assim que conseguiremos mudar alguma coisa.
Procel Info: E você falou sobre a importância das pequenas práticas que as empresas podem adotar para serem mais eficientes. Além da questão da mudança de cultura, poderia citar algumas ações práticas? Como as empresas podem começar?
Sérgio Grassi: Nas empresas, o que acontece muitas vezes, é que as atividades são muito segmentadas. Cada um é responsável por um "quadrado" e às vezes não tem uma integração. A empresa pode divulgar frases do tipo "E aí, viu?", e continuar com "E fez o quê?". O funcionário às vezes passa e vê um vazamento, ou uma lâmpada acessa e não faz nada, como se não fosse com ele. Campanhas deste tipo costumam dar muito certo e às vezes motivam as pessoas a relatarem o problema, mesmo que elas não sejam as responsáveis por resolver. Isso cria um ambiente de incômodo com alguma anormalidade. Esse é só um exemplo de uma atividade simples e sem investimento e que traz um resultado em um primeiro momento. Claro que isso vai esgotar e você vai ter que partir para um investimento, análise de processos, que realmente vão trazer um resultado maior. Mas temos que começar do começo. Não adianta acharmos que grandes investimentos vão resolver os problemas da empresa, sendo que você queimou várias etapas e já foi lá para a última. E eu diria que no primeiro momento, 70% a 80% da economia vem dessas pequenas ações de mudanças de procedimentos e de comportamentos das pessoas, como este exemplo que eu dei. Coisas que trazem benefícios e despertam as pessoas para a redução e eficiência no uso da energia de todas as formas.
Atual Diretor comercial da Viridis, Sérgio Grassi trabalhou durante 35 anos na Vallourec do Brasil, nas áreas de energia, manutenção e montagem industrial e coordenou o projeto da área de Energia e Utilidades da usina Vallourec & Sumitomo (VSB). Graduado em Engenharia Elétrica e pós-graduado em Automação Industrial e Gestão de Negócios, é membro da CB-116, que elaborou a ABNT NBR ISO 50.001 – Sistemas de Gestão da Energia, e foi o responsável pela certificação da Vallourec como primeira siderúrgica do Brasil nesta norma. Também é membro da Câmara de Energias Renováveis e Óleo & Gás da FIEMG.
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