O plano de evacuação da população no caso de um acidente nas usinas nucleares brasileiras em Angra dos Reis deve ser melhor formulado. Foi o que disseram nesta quarta-feira (23) os professores Luiz Pinguelli Rosa e Aquilino Senra Martinez, diretor e vice-diretor do Instituto Alberto Luiz Coimbra de Pós-graduação e Pesquisa de Engenharia (Coppe), da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
Na segunda parte da audiência pública para debater o Programa Nuclear Brasileiro e a segurança das usinas, os dois professores também salientaram a necessidade de um local seguro para o depósito de rejeitos radioativos, de baixa, média e alta atividade. Um terceiro ponto abordado foi a necessidade de se manter geradores de energia para resfriamento da usina em local seguro, para evitar problemas como o que acontece agora na usina de Fukushima, no Japão.
A audiência pública foi realizada em conjunto pelas Comissões de Ciência, Tecnologia, Inovação, Comunicação e Informática (CCT); de Serviços de Infraestrutura (CI); e de de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA). Os trabalhos foram dirigidos pela presidente da CI, senadora Lúcia Vânia (PSDB-GO), auxiliada pelo presidente da CMA, senador Rodrigo Rollemberg (PSB-DF). Também apresentaram perguntas aos expositores os senadores Marcelo Crivella (PRB-RJ) e Lindbergh Farias (PT-RJ).
Luiz Pinguelli Rosa afirmou que o plano de evacuação da população próxima às usinas de Angra chegou a ser secreto no governo militar.
- Era como um edifício cujas saídas de incêndio eram secretas, para não causar nas pessoas medo de um incêndio – ridicularizou.
O professor lembrou que o raio de exclusão inicialmente previsto, em caso de acidente, era de 15 quilômetros, mas posteriormente foi reduzido para cinco. Afirmou, no entanto, que é preciso “contar com um azar maior”. Enfatizou que um plano de evacuação envolve as administrações federal, estadual e municipal.
Já Aquilino Senra Martinez afirmou que os raios de evacuação “certamente vão ser rediscutidos, não só no Brasil, mas mundialmente”. Afirmou que os padrões aceitos, até o acidente de Fukushima, estabeleciam evacuação até cinco quilômetros, com a recomendação de as pessoas se abrigarem dentro de casa até 15 quilômetros. No Japão, houve evacuação de 140 mil pessoas em um raio de até 30 quilômetros da usina.
Para Pinguelli Rosa, a decisão imediata da evacuação pelas autoridades japonesas foi muito importante para evitar danos à população. Ele lembrou, no entanto, que o povo japonês é muito treinado e disciplinado, enquanto o brasileiro, além de indisciplinado, não tem o mesmo nível de treinamento. Disse também que as linhas de evacuação são bastante limitadas.
Rejeitos
Aquilino Senra Martinez lembrou aos senadores que o Congresso Nacional aprovou há alguns anos um projeto que dá à Comissão Nacional de Energia Nuclear (CNEN) a responsabilidade de projetar e construir depósitos para rejeitos radioativos de baixa e média atividade gerados pelas usinas nucleares. Para ele, basta que os parlamentares exijam o cumprimento daquilo que já foi aprovado. Mas afirmou que é preciso saber se a CNEN tem condições financeiras e técnicas para executar o que a Casa aprovou. E se há recursos, no orçamento da entidade, para isto. Já os rejeitos de alta atividade, para ele, devem ser deixados no complexo das usinas, onde já estão, devido a dificuldades de transporte e de se definir um local adequado para o colocação.
Luiz Pinguelli Rosa afirmou que, quando inspecionou as usinas de Angra 1 e 2 anos atrás, alguns galpões utilizados como depósitos para rejeitos de baixa e média atividade eram adequados, mas outros, não. Enfatizou que nunca foi feito um depósito definitivo, apenas provisórios. Ele concordou que os rejeitos de alta atividade devem também ficar nas piscinas de resfriamento que já ocupam dentro do complexo da usina.
Geradores
As usinas nucleares precisam de água para sua refrigeração, por isso sempre se situam próximas do mar ou do leito de rios. As usinas nucleares da próxima geração já contam, em seus projetos, com medidas de resfriamento passivo. Mas as 440 usinas hoje em funcionamento no mundo necessitam de geradores para bombear água para resfriar os reatores depois que estes são desligados, já que continuam a emitir energia e gerar calor. Do contrário, podem derreter, gerando reações químicas que, por sua vez, geram explosões que destroem os sistemas de contenção da usina e acabam por espalhar a radioatividade. A inoperância desses geradores externos foi o que gerou o problema em Fukushima.
- É uma máquina rebelde: quando a gente desliga, ele continua funcionando – explicou Luiz Pinguelli Rosa.
Para Senra Martinez, “é inaceitável” o que ocorreu no Japão, onde os geradores de emergência não puderam ser ligados para resfriar os reatores. Isto, segundo ele, irá provocar discussões mundiais sobre a questão. Afirmou que os parlamentares devem cobrar das autoridades brasileiras um plano para que os geradores estejam operáveis em quaisquer situações.
Lindbergh Farias e Marcelo Crivella defenderam mais estudos sobre os quatro reatores nucleares que o governo brasileiro pretende construir. Argumentaram que a energia nuclear é responsável por apenas 2% da energia consumida no Brasil – no mundo, chega a 17%, e em países como a França, a 80% – e o Brasil tem uma matriz energética muito diversificada.
O senador Rodrigo Rollemberg indagou se não seria melhor criar um programa de eficiência energética, envolvendo a população com campanhas para diminuir o consumo, do que criar novas usinas. Senra Martinez afirmou que a campanha, mesmo que gere uma grande economia, não irá “zerar” o aumento do consumo. Mas considera que as duas coisas não são excludentes: é preciso aumentar a eficiência energética, ao mesmo tempo em que se criam novas fontes de energia.
Respondendo à senadora Lúcia Vânia, Pinguelli Rosa afirmou que o depósito construído na cidade de Abadia para guardar o material radioativo resultante da contaminação com o Césio 137 foi feito com competência técnica e que o socorro dado às pessoas contaminadas foi eficaz, no primeiro momento. Mas contestou o fechamento da Fundação Leide das Neves, criada para dar assistências às pessoas contaminadas por radiação, que hoje dependem somente da assistência do Sistema Único de Saúde (SUS). Ele lamentou também que os responsáveis pela tragédia tenham ficado impunes, “por causa dessa Justiça esculhambada do Brasil”.
José Paulo Tupynambá / Agência Senado
Postar um comentário